Acho que essa é a primeira vez em que reluto em escrever um post sobre a Guatemala. Quando pensei em criar o blog para contar minhas andanças nas terras maias, não tinha a mínima ideia de como seria chegar ao final da experiência mais linda e maluca da minha vida.
Eu compartilho a opinião de que um texto toma vida própria a partir dos rabiscos das primeiras palavras. Isso que estou escrevendo já não é meu, senão representa o caminho por onde essa história quis se entranhar. E aqui estou eu, encarando meu computador, tentando encontrar subterfúgios para me despedir deste blog e da minha vida chapina, confesso que um pouco tarde, já que há algumas horas pousei em território brasileiro. Porém, a vida aqui continua mais chapina que nunca, embrenhada de memórias, risadas, amores, emoções e, claro, com sua quantidade relativa de lágrimas.
Por isso eu me recuso a me despedir desse blog assim, a seco. Pois saibam (e eu aqui espero aguçar expectativas) que esse será meu penúltimo post, já que uma despedida de verdade exige uma edição especial (e final snif snif) do Mira Pues, ainda que a produção, direção e elenco já estejam em solo brasileiro. Entretanto, contudo e todavia (e a partir de agora é muito engraçado escrever todavia sem pensar que isso em espanhol significa ainda), declaro virtual e publicamente postergar esse adiós até onde não conseguir mais.
Nesse último mês na República de Quauhtlemallan (assim descobri eu que se chamava essa terra bonita antes dos espanhois chegarem) aproveitei pra dar umas últimas voltas no país e acabei conhecendo o que há de recôndito por aqui (quer dizer, por lá... lá na Guatemala). Assim fomos parar na cidade de Huehuetenango (creio que 80% das cidades chapinas terminam em “tenango”: Chichicastenango, Chimaltenango, Quetzaltenango... Já posso imaginar que tenango vem do maia “fim do mundo” e é claro que aí se encontra a oportunidade de visitar lugares que pessoas mais normais não fazem ideia de que existam). Huehue é até grandinha e tal, mas os povoados em volta que me pareceram coisa do outro mundo, enquanto pra eles são super normais, óbvio.
1ª parada: Ruínas de Zaculeu >> pirâmides, pirâmide e pirâmides maias. Maluco!!
2ª parada: Todos Santos
De Huehue pegamos um mini-bus por 3h subindo uma serra com o nascer do sol mais lindo ever até chegar a este pueblo na divisa com o México onde as pessoas quase não falam espanhol. Todos se vestem iguais e as lojas vendem sempre aquele conjunto básico de calça vermelha com listrinhas para os homens e saias típicas azuis para as mulheres, blusas brancas com detalhes azuis e um chapéu de não-sei-o-quê com uma fitinha azul. Enfim, descobri que pra estar na moda nativa é necessário economizar. O look completo sai entre 400 a 500 reais. O conjunto da obra é bonito e interessante, mas os tecidos cheiram a cabrito, aí vocês podem imaginar o odor dentro de uma van fechada cheiaaaaaa de descendentes maias.
O mais interessante em Todos Santos é que a vida não passa e o mais legal é sentar na pracinha e ver a vida não passando e esconder-se do frio... Aí sim você se sente um estrangeiro infiltrado entre os nativos, observando aquela língua impronunciável e tentando entender que eles fazem da vida. Isso foi fácil descobrir, porque além da agricultura, 90% do PIB do povoado é proveniente das lojinhas (em espanhol “tiendas”) que vendem de tudo: de chiclete a fralda, passando por energéticos e sopas instantâneas. A impressão que dá é que existe uma tienda para cada habitante, bizarro! Em Todos Santos aprendi 3 coisas: o ser humano realmente não precisa de muita coisa pra viver, a logística da Coca-Cola é absurda (sim, os nativos em suas roupas pré-colombianas tomam refrigerante!), e há alguns anos um japonês foi morto depois de tirar foto de uma criança do povoado. Os todo-santenses pensaram que ele e o grupo da excursão planejavam sequestrar a niña para um ritual satânico. O mais legal é que só soubemos disso depois da viagem, e depois de tirar 567 fotos de crianças, velhos e adultos, gracias, muy amable, oíste?!
3ª parada: Aguacatán – não vou comentar muito, mas a gente conheceu um rio nascendo e pegou um tuk-tuk cujo motorista se chamava Nacho e tinha um prego na orelha.
4ª parada: Momostenango (olha o tenango aí outra vez!) – só pra saber: chegamos lá para conhecer uma erosões que resultaram num monumento natural muito bonito, porém fazendo a curva numa rua qualquer nos deparamos com um desfile de fantasias totalmente aleatório. Uma produção impecável e um recuerdo eterno. Nessa vida eu nunca poderia imaginar que veria o elenco de Alice no País das Maravilhas dançando cumbia e salsa ao lado de Austin Powers e do Homem-Aranha.
Outras paradas depois... Jalapa. Viajando por lá cheguei ao vulcão (inativo, amém!) de Ipala, onde supostamente o carro chegava até quase o topo e da lá seria uma andadinha de 5 minutos até a cratera. Não foi bem assim, o carro ficou embaixo e tivemos que subir 1h entre pedras, resquício de asma e inclinações. Perdas de fôlego a parte, tudo valeu a pena quando na cratera se encontra uma lagoa linda e a paisagem e companhias perfeitas em meio a um frio cortante.
O lance é que depois de todo esse tempo de intercâmbio minha cabeça mudou (o corpo também depois das libras a mais haha), e mesmo em ares brazucas, por hoje só respiro Guatemala.
Mais fotos em um link no último post.
*Ao som dos mais queridos dos queridos: